Preseason Week 2: Heróis e Vilões

Paulo Pereira 24 de Agosto de 2015 NFL, Preseason Comments
Johnny Manziel

Preseason Week 2: Heróis e Vilões

A week 2 da preseason está já [parcialmente, faltando os jogos de Domingo] nos livros, mas deixou histórias para contar. Muitas e saborosas, em narrativas repletas de heróis e vilões, forjados dentro de campo.

Heróis

Johnny Manziel

Não será ainda caso para um “here’s come Johnny”, mas os baby steps que Manziel tem dado são promissores. O quarterback, com um potencial enorme, sabe que tem que reconquistar a confiança. Dele, mas principalmente dos fãs e, sobretudo, do staff técnico dos Browns. O ano rookie mostrou um miúdo imaturo, com um comportamento grosseiramente a pisar as regras do profissionalmente correcto. A corda, nesta relação laboral, esticou mas não partiu. Johnny Manziel é, para o bem e para o mal, uma first round pick. E nenhuma franquia abre mão duma escolha tão alta, logo ao primeiro percalço.  A abordagem no ano 2, por parte da franquia, mostrou aquela dose de disciplina necessária, quase como um pai que castiga um filho traquinas. Manziel foi relegado na depth chart, mais por protecção de si mesmo do que por castigo. Mas isso teve, pelo menos, o condão de despertar o jogador para uma realidade onde ele, finalmente, não é o centro das atenções. O ego de Manziel pode não ser domável, mas é controlável. Dizem as crónicas da offseason e do training camp que Manziel foi apenas mais um jogador, entre os restantes. Sem sobrancerias, trabalhando arduamente para se afirmar no competitivo mundo. Os Browns têm Josh McCown, veterano de inúmeras batalhas, no ocaso da sua carreira, que poderá ser o game manager necessário, enquanto Manziel amadurece, na sideline. Mas McCown sabe também que é uma solução de curto prazo, um penso rápido num corte que sangra. Fora de campo pode ser um mentor, que Manziel nunca teve. Será prematuro afirmar que esta situação, gerida de forma sábia pelos Browns, tem resultado. Apenas se passaram 2 jogos na preseason. Mas em ambos Manziel mostrou evolução, um maior equilíbrio no pocket, enquanto mostrava que os seus predicados estavam intactos. Aquele sentido de imprevisibilidade, a capacidade quase mágica de encontrar um alvo, quando a jogada parece morta. O recente jogo contra os Bills apenas veio acentuar o estado de ânimo entre os fãs dos Browns: é ali que está o franchise quarterback. Manziel foi fluido nos movimentos, longe do jogador errático de 2014, jogando de forma conservadora, mas nunca deixando que esse mesmo instinto protector inibisse a sua capacidade de playmaker. O seu passe para TD serviu apenas para confirmar que ele será o QB dos Browns, mais semana menos semana.

Xavier Cooper

Xavier Cooper, com uma carreira estelar em Washington State, aproveitou o Combine para mostrar as suas qualidades. Ter um defensive linemen a correr as 40 jardas em 4,86 abriu muitas bocas de espanto. Enamorados pelo que o defensive end poderia trazer à equipa, em termos de futuro, os Browns fizeram um trade up e resgataram o jogador no 3º round do draft. Nos dois primeiros jogos da preseason deu para perceber o porquê do movimento. A velocidade e capacidade de explosão de Cooper têm ajudado o front seven da equipa. A sua participação, para já, rendeu-lhe 3 sacks e aumentou as expectativas para o que aí vem. A intenção inicial era dar alguns snaps – poucos – na regular season, dado que os dois Bryants (Dezmond e Armonty) monopolizam a maioria, do lado esquerdo da defesa. Mas agora, se Cooper provar que pode ser tão efectivo a defender a corrida, como tem sido na defesa do passe, poderemos ter uma rising star bem à nossa frente.

Shane Wynn

Ainda nos Browns, parece que a equipa tem o dom de descobrir nos anos mais recentes um receiver saído do nada. No ano passado foi Taylor Gabriel. A sensação deste ano é Shane Wynn, um undrafted vindo de Indiana. Não se sabe ainda se Wynn fará o roster final. Se houve uma área na offseason que mereceu atenção foi a depth na unidade. Andrew Hawkins, Brian Hartline, Taylor Gabriel, Travis Benjamin e Dwayne Bowe são donos de 5 lugares,  num roster que levará, quando muito, 6 wide receivers. A Wynn resta-lhe lutar pela derradeira vaga com Vince Mayle, draftado este ano, Marlon Moore, Josh Lenz e Terrelle Pryor, ex-quarterback que procura, com a mudança de posição, um novo começo na sua carreira. Com 5’6’’ e meras 167 pounds parecia difícil que Wynn sobrevivesse a tão forte concorrência. Mas, treino a treino, o que ele tem feito é receber bolas. Receber bolas. E receber bolas. Contra Buffalo tratou de capitalizar os poucos snaps recebidos e marcou pontos. Literalmente. Na sideline, ludibriou a marcação de Duke Williams e recebeu o passe de Manziel na end zone, num belíssimo momento. Jogando no slot e contribuindo no special team (como no punt return de 58 jardas), Wynn desafia as probabilidades. E até parece possível vencer este desafio.

Washington Redskins Running Backs

O backfield dos Redskins deu um show contra os Lions. Quando se fala do jogo corrido da equipa da capital, todos remetemos esse esforço para o incontornável nome de Alfred Morris. Merecidamente. Ele é o dono e senhor do lugar. Mas os Skins souberam dar profundidade ao sector, adicionando talento e juventude. Nessa sofreguidão, tão típica de quem tem tanto para provar, todos eles quiserem reivindicar o seu quinhão de snaps. Matt Jones, Chris Thompson e Trey Williams foram empolgantes, quando tudo estava em avaliação, conseguindo cada um deles um highlight na partida. Corridas com cuts soberbos, fintas desconcertantes, provando que há vida para além de Morris. É favor acompanhar a carreira futura destes miúdos.

Eric Berry

9 meses. Se para uns é um mero marco temporal, para Eric Berry foi o tempo que demorou a voltar a pisar um campo de futebol, depois de diagnosticado com leucemia. Mantendo vivo o sonho de regressar, fortemente apoiado pelos Chiefs, que vêem nele um jogador nuclear para a defesa, sofreu em cada um dos dias, nessa caminhada rumo à luz. Finalmente, pode sentir o carinho da imensa legião de adeptos da franquia de Kansas, no jogo com os Seahawks. Não deu ainda para jogar na plenitude, mas a mera presença na sideline é uma vitória. Para ele, na luta sem tréguas contra o monstro. E para nós, que nos comovemos com momentos de superação destes.

Kenjon Barner

A decisão de cortar jogadores nunca é fácil. Primeiro, dos 90 actuais para 75. Depois, para 53, o número final. No espaço que entremeia estes cuts, os jogadores sabem que qualquer jogada, qualquer snap, é minuciosamente visto pelo staff técnico, podendo um deles representar o passaporte rumo ao sonho ou a procura de um novo emprego. Os Eagles, tal como as restantes 31 franquias, vão ter que entrar brevemente nesse processo. E vão ter (boas) dores de cabeça. Peguemos no jogo corrido, por exemplo. A depth chart é o sonho húmido de qualquer coordenador. Talento, qualidade e opções variadas. DeMarco Murray é o putativo titular. Terá menos desgaste do que o sofrido em Dallas, mercê da já falada profundidade na unidade. Ryan Matthews permitir-lhe-á ganhar o fôlego, enquanto mantém o nível competitivo similar. Ambos serão preciosos no ground & pound, como se viu contra os Ravens. Elusivos, com velocidade, tiveram bons momentos. E o que dizer de Darren Sproles? Também podem contar com ele no solo e como elemento fulcral no jogo de passe. Sproles tem essa dimensão, a de conseguir jogar fora do backfield com a mesma eficiência. O trio fará parte dos eleitos finais. Não restam dúvidas. Mas o que fazer a Kenjon Barner? Pelo 2º jogo consecutivo, o antigo running back de Oregon (território sob o domínio de Chip Kelly, curiosamente o seu treinador actual) mostrou que pode ser útil. Como? Na única forma de sobressair. Não era possível que, com a competição interna, Barner tivesse qualquer possibilidade de ganhar snaps. Assim, o seu contributo no special team seria sempre o elemento diferenciador. E aí ele tem impressionado, com dois punts retornados para touchdown. O deste fim-de-semana, contra os Ravens, é qualquer coisa de delicioso de assistir. Kenjon, numa zona cheia de tráfego, foi-se esquivando a sucessivos tackles, até conseguir usar a sua velocidade de ponta em open field. Depois disto, será muito difícil que ele seja cortado do lote final. Com Chip Kelly, nunca se sabe, mas Kenjon Barner tem feito o suficiente para merecer uma oportunidade. Válida.

Vilões

Jay Gruden

É uma espécie de ser preso por ter cão. E não ter. Mas diz o senso comum que os jogadores mais importantes numa equipa sejam utilizados de forma muito ligeira nos jogos da preseason. Porquê? Para evitar lesões que, num mero momento de infortúnio, possam fazer descarrilar a temporada. Tem sido assim com os Eagles, que poupam Sam Bradford, o seu quarterback. Vindo de 2 torn ACLs, é elementar que o jogador, se pisar os relvados, o faça brevemente, evitando uma exposição a hits desnecessários. Quem fala em Bradford, fala de Peyton Manning, Adrian Peterson e tantos outros. A lógica não se aplica sempre. Numa equipa em que as posições estejam ainda por sedimentar, é normal dividir os snaps pelos concorrentes, para ver qual deles ganha vantagem. Exemplo? Os Bills, sem decisão tomada quanto ao titular no posto de quarterback. Sem um favorito, distribuem-se os snaps. Mas, e os Redskins? RG3 tem vantagem sobre Kirk Cousins. Será (ou melhor, seria) ele o titular, na regular season. O jogador, depois do fantástico ano rookie, sofreu uma lesão que lhe provocou evidentes problemas na locomoção, parte integrante do seu jogo. Por isso, para quê dar-lhe tantos snaps na preseason? O estilo de play action, read option, com o quarterback a fazer alguns scrambles, aconselhava desde logo cautela no seu uso. Mas Jay Gruden resolveu testá-lo. Mais uma vez. Aparentemente, o 1º período não serviu de bom conselheiro ao head coach dos Skins. Uma OL porosa, incapaz de travar o pass rush dos Lions, já tinha submetido RG3 a um tratamento duro, com vários sacks e hits sofridos. Ele permaneceu em campo. Até a uma blitz levar DeAndre Levy a um tackle duro (mas limpo), que prostrou RG3 no solo, durante largos minutos. O prognóstico, dado mais tarde, fala em concussão. E adensa dúvidas. O que se passou na cabeça de Gruden?

New York Jets

Os Jets. Ai os Jets. A chegada de Todd Bowles abriu uma nova era na franquia. E, como em todas as novas ocasiões, a esperança é grande. Percebe-se o porquê. O regresso do filho pródigo Darrelle Revis ajudou a aumentar o hype em redor da equipa, mas os jogos da preseason têm deitado alguma água na fervura. Nota-se que a implementação de um novo sistema ofensivo e defensivo tem sido feita por etapas, e a absorção dos novos métodos ainda não está concluída. A franquia, entretanto, tem aparado a sua dose de golpes. Primeiro, com Sheldon Richardson, já castigado com 4 jogos, a prevaricar em problemas com as forças policiais e a deixar de ser uma opção. Ao rude golpe juntou-se o caricato caso que envolveu Geno Smith. O quarterback, que seria presumivelmente titular, fica arredado da competição por conta de um soco. A ascensão de Ryan Fitzpatrick ainda não galvanizou o ataque, como se viu contra os Falcons, com 5 das 6 drives por si conduzidas a terminarem em punts. Valeu, na circunstância, o fenomenal touchdown de Chris Ivory, numa corrida de 33 jardas, para amenizar um pouco da mediocridade generalizada. Haverá motivos para alarme em NY? Tudo depende das expectativas. Os Dolphins parecem sólidos e capazes de lutarem pelo título de divisão. Os Bills estão a um quarterback de distância para serem uma força reconhecida na conferência. E os Patriots dispensam apresentações. Os Jets irão padecer fortemente na temporada, mas com alguns motivos para sorrir. Como Leonard Williams, que foi magnífico contra os Falcons, com um safety e uma série de movimentos disruptivos.

Terrell Suggs

Há hábitos que não se perdem. Mesmo na preseason. Não gosto de Terrell Suggs. Sim, é um jogador veterano, fenomenal nas suas acções, mas considero-o um daqueles jogadores “sujos”, uma espécie de sociopata em uniforme de jogo. Mau até à medula, conseguiu criar uma (falsa) aura de jogador guerreiro, duro e defensor das cores da franquia onde joga. Pode iludir meia dúzia de iluminados que, a coberto de um jogo de contacto como é o futebol americano, acham que todas as acções são justificáveis. Não são. No jogo contra os Eagles, Suggs foi desnudado pelas câmaras de televisão, mais uma vez. Provavelmente, com as consequências de sempre. Nada lhe acontecerá. Sam Bradford é um adversário. É um facto. Mas sabe-se igualmente que o quarterback tenta recuperar fisicamente, depois de dois torn ACLs em 2013 e 2014. A primeira acção que Suggs tem, no jogo, é um tackle, bem depois de Bradford lançar a bola, à parte inferior das pernas de Bradford. Entenda-se por parte inferior exactamente o que estão a pensar. Abaixo dos joelhos, bem na zona onde a reabilitação incidiu. E não se esqueçam do que escrevi acima. O tackle foi feito BEM DEPOIS da bola ter sido lançada. A ilação é fácil de tirar. Aquilo foi um cheap shot, destinado a lesionar novamente Bradford. Não que este, por jogar na NFC, seja um adversário a ter em conta na caminhada dos Ravens, equipa que milita na AFC. Apenas porque este é o modus operandi de Suggs. Como diria um treinador de soccer, em Portugal, “um vintém será sempre um vintém, e um cretino será sempre um cretino”.

Carolina Panthers

Não se deixem enganar por resultados, nesta fase da temporada. Os Panthers até venceram os Dolphins, por 31-30…mas há fortes motivos para estarem preocupados. Sem Kelvin Benjamin, o seu leading receiver, para a temporada toda, a vida ficou muito mais difícil para Cam Newton, como se comprovou nas drives por ele conduzidas. Um 4 em 10, no passe, com os seus 3 primeiros lançamentos a serem falhados e o 4º a ser interceptado, dão bem conta do sentido de orfandade que o ataque tem, sem Benjamin. Greg Olsen continua a ser a válvula de segurança, mas sozinho não consegue dar a dimensão necessária para evitar os problemas visíveis na movimentação ofensiva no campo. É um facto que Devin Funchess, escolha do draft deste ano, não pode dar o contributo por se encontrar lesionado, mas mesmo com ele em campo, será difícil para os Panthers ultrapassarem a perda de Benjamin. Eis o que uma lesão, num jogador nuclear, pode fazer a uma equipa, que aparentava ter um ataque com soluções.

About The Author

Paulo Pereira

O meu epitáfio, um dia mais tarde, poderá dizer: “aqui jaz Paulo Pereira, junkie em futebol americano”. A realidade é mesmo essa. Sou viciado. Renascido em 2008, quando por mero acaso apanhei o Super Bowl dos Steelers/Cardinals, fiz um reset em [quase] todos os meus dogmas. Aquele desporto estranho, jogado de capacete, entranhou-se no meu ADN, assumindo-se como parte integrante da minha personalidade. Adepto dos Vikings por gostar, simplesmente, de jogadores que desafiam os limites. Brett Favre entra nessa categoria: A de MITO.