Packers @ Seahawks: Lord, Have Mercy. We Have Percy Harvin!

Paulo Pereira 6 de Setembro de 2014 Análise Jogos NFL, NFL Comments
Green Bay Packers @ Seattle Seahawks

Green Bay Packers at Seattle Seahawks

Foi assim, quase textualmente, que Russell Wilson sintetizou o jogo de abertura da nova temporada da NFL. Mas, como se chegou até aqui? Já lá vamos. Antes, a criação de um cenário. O jogo de abertura, após 7 longos meses de ausência, é encarado pelos fãs de forma ávida. Compreende-se. São os sintomas de abstinência, tornando-nos a todos uns consumidores compulsivos de futebol americano. O jogo inaugural tem uma aura a rodeá-lo. É lá que, geralmente, os campeões em título são vitoriados pelo seu público, após a conquista do Super Bowl. O deste ano não fugiu à regra…com um ingrediente extra. Trouxe até à longínqua Seattle uma série de rostos conhecidos. Os “cabeças de queijo” de Green Bay. Se bem se recordam foram estas duas equipas as protagonistas de um dos mais infames episódios na história recente da competição. Era a altura da greve arbitral, que colocou na ribalta os seus substitutos, juízes pouco preparados (e dizer isto, desta forma, é um eufemismo) para a complexidade do jogo. O Fail Mary, como ficou conhecido o polémico final desse encontro, criou uma nova rivalidade. Mas, desde então, os Seahawks cresceram. De forma tremenda, até atingirem o trono desejado. Num novo embate, que colocaria frente-a-frente dois dos mais empolgantes quarterbacks da actualidade, e duas das mais poderosas formações da NFC, os Packers iriam tentar contrariar o favoritismo caseiro, enquanto procuravam concertar estratégias, numa semana que trouxe para a ribalta o nome de um neófito no meio: Corey Linsley. Todos aqueles que estão, neste exacto momento, a questionar mentalmente “mas quem raio é o Corey?”, eu respondo. É o center. O homem responsável pelos snaps. Um rookie. Lançado aos lobos. Evan Dietrich-Smith saiu, na free agency, deixando o lugar vago para ser ocupado por JC Tretter. Num daqueles habituais episódios que pontuam a actualidade da NFL, Tretter lesionou-se e o next man up…era Linsley. Num ambiente feericamente ensurdecedor, com o CenturyLink Fields a ter o título oficioso de estádio mais barulhento, como se portaria o jogador? E que influência teria no jogo de ataque a sua inexperiência?

O Jogo

Começo a acreditar na teoria da conspiração que grassa pelos blogues e sites afectos aos Seahawks. Não. Não há queixas sobre árbitros. Ou sobre a NFL e Goodell. Os dedos acusadores apontam a discrepância de tratamento televisivo. Os campeões em título têm apenas um jogo marcado em horário nobre. Este. O Thursday Night Football. E a teoria diz que isso acontece pelos correctivos que a franquia de Seattle ministra aos seus adversários, dando verdadeiras “tareias”, tornando os jogos sensaborões e, com isso, baixas audiências. Por arrasto, as TVs optam por não transmitir jogos da equipa de Pete Carroll. Verdade ou ficção? Tirem as vossas conclusões, mas os Seahawks tinham-me impressionado no jogo da preseason contra os Bears, na semana 3. O ritmo impressionante, o ataque cirúrgico e letal, a quantidade obscena de armas disponíveis para Wilson usar e, claro, a intratável e agressiva defesa. Esse todo torna a equipa uma arma punitiva, batendo, batendo, batendo, até deixar o rival nocauteado. Mudou-se a agulha da preseason para a regular season. O adversário sofreu um upgrade. E os Packers, que se gabam de, finalmente, ter um roster pejado de soluções, sofreram o mesmo tratamento. O jogo começou lento. Conservador até. As equipas procuravam não cometer erros, protegendo a bola e usando jogadas criativas, explorando as qualidades dos seus jogadores. Começou lento, mas evoluiu. Gradualmente. Desde cedo se percebeu que Seattle, mesmo com um anel de campeão a adornar os dedos dos seus atletas, não traiu os seus princípios de jogo. O running game continua presente, como filosofia de vida, e massacra. Marshawn Lynch foi emergindo, aos poucos, como ariete que ia derrubando a resistência contrária. Cris Collinsworth comentava, ao ver o jogo, que se pode mediatizar o Combine, e criar parangonas com os tempos fantásticos que alguns conseguem nas 40 jardas, mas que um running back de elite se detecta em pormenores. Como a capacidade de iludir adversários num curto espaço de terreno. Ou a forma como se ganham jardas, após contacto, quebrando tackles. Lynch fez isso. E muito mais, esticando o jogo, dando-lhe identidade, mantendo a fluidez no ritmo da equipa. Podia não bastar. Mas os Seahawks não são apenas isto. Nunca foram, mesmo que alguns continuem a tentar menosprezar os seus êxitos. Russell Wilson continua a ser um game manager. No bom sentido. É o mestre de marionetas. O homem que usa os fios, e os puxa, de forma sábia, sabendo quando lançar, ou quando correr. Golden Tate saiu, na free agency. E ninguém carpiu mágoas. Percebe-se. Percy Harvin, quando saudável, é um quebra-cabeças. Ele retorna kickoffs. É usado no backfield, ludibriando as marcações. Aparece no slot, usando a sua velocidade. E, com isso, jardas. Sempre jardas. E mais jardas. O resto foi o do costume. Os Packers foram sendo anulados, aos poucos. As grandes equipas são assim. Adaptam-se. E ajustam-se. Os Seahawks entraram mal, permitindo que o jogo corrido do adversário se impusesse. No special team, uma estranha fragilidade, com um muffed punt. Mas os obstáculos ultrapassam-se. A franquia de Seattle é um camaleão, na capacidade de absorver os erros, aprender com eles e vencê-los. Lacy deixou de ter espaço- Os tackles tornaram-se impiedosos. O pass rush abriu brechas. Rodgers deixou de ter tempo, no pocket. E o jogo que parecia competitivo foi resvalando para uma superioridade mais esmagadora do que o resultado final indica.

As Nossas Escolhas

MVP

Percy Harvin: Who else? Percy Harvin. Foi ele a alma do ataque, a arma surpresa, depois duma temporada passada nos cuidados da enfermaria. Se ele jogar sempre assim, este ano, a capacidade de explosão do ataque dos campeões em título aumenta exponencialmente. Harvin esteve em todo o lado, qual Houdini dos tempos modernos, ludibriando os defesas. Foi receiver, com 7 recepções para 59 jardas. Foi running back, correndo 4 vezes para espantosas 41 jardas. Contribuiu com 3 retornos nos kickoffs, amealhando mais 60 jardas. E sim, contaram bem, 14 toques na bola. 160 jardas. A sua posição não devia dizer, na depth chart, wide receiver. Ficava melhor um mais abrangente THREAT!

Positivo

A Linha Ofensiva dos Seahawks: As guerras ganham-se nas trincheiras, certo? Se a OL era apontada como o calcanhar de Aquiles, no ano passado, continuou a ser olhada com desconfiança, nesta offseason. Saiu Breno Giacomini (para os Jets), mas os restantes quatro elementos permaneceram. No embate contra os Packers, a OL foi tremenda na criação de bloqueios para Lynch correr, esmagando a DL dos Packers, onde a ausência de BJ Raji se sentiu claramente. Sem ele, o trio da frente foi sempre impotente para travar os elementos mais pesados da OL, sobretudo os dois guards, que foram instrumentais. James Carpenter, jogando do lado esquerdo, e JR Sweezy, do lado direito, praticaram bullying todo o jogo, permitindo que Lynch corresse a seu bel-prazer. 8,4 jardas de média, ao intervalo, e 5,5 no final da contenda, mostram bem os estragos feitos na DL.

A Defesa dos Seahawks: Tem a fama e o proveito. É a melhor nos sites de fantasy e percebe-se o porquê. São agressivos. E ajustam-se às dificuldades. A secundária tapou os caminhos para o sucesso alheio. Richard Sherman viu como Aaron Rodgers procurava sempre o outro lado, fugindo da zona por ele coberta. Mesmo assim Byron Maxwell, mantido debaixo de fogo, saiu com a reputação incólume, interceptando o QB e limitando os danos. O pass rush aproveitou a saída de Bryan Bulaga por lesão para atormentar, o resto da noite, Aaron Rodgers. Michael Bennett e Cliff Avril são dois demónios à solta, cada um creditado com um sack, o de Bennett levando a um safety. E contra o jogo corrido? A mesma coisa. Um verdadeiro tutorial de como se devem fazer tackles. Eddie Lacy começou em grande estilo. 3 corridas iniciais, 24 jardas ganhas. Depois, foi “espancado”. Sem uma nesga de espaço, o RB dos Packers lutou, sem qualquer sucesso, conseguindo apenas 10 jardas nas nove corridas seguintes.

Marshawn Lynch: 20 corridas, 110 jardas, 2 touchdowns, mais uma recepção para 14 jardas. Impressionante! O beast mode está vivo e recomenda-se, mesmo perdendo os primeiros 8 dias do training camp e tendo apenas 3 corridas na preseason.

Russell Wilson: Novamente, Cris Collinsworth tem uma sentença que resume aquilo que é, actualmente, o quarterback dos Seahawks. Dizia o comentador do jogo que existem QBs muito bons e outros que, não o sendo, tinham muita sorte, e que Wilson tinha ambas as qualidades. E isso é verdade. Wilson vive em permanente estado de graça, safando-se de situações difíceis com classe, mostrando toda a sua vasta gama de recursos, gerindo o ataque num ritmo sempre elevado. Quando isso não chega, aparece a sorte. Por duas vezes esteve perto de ser interceptado, e em ambas as ocasiões safou-se. Numa delas, com a divina e providencial intervenção de Zach Miller. No resto do jogo, foi capaz de se conectar com os seus receivers, como na fantástica simulação na read-option, em que enganou toda a gente, passando depois de forma fácil para um TD de Ricardo Lockette.

Clay Matthews: Usado por Dom Cappers de várias formas, Matthews correspondeu sempre, ajudado parcialmente por Jullius Peppers. Pressionante e disruptivo, conseguiu sempre provocar sobressaltos na OL, importunando a pacatez ali vivida. Não sendo a sua especialidade, foi mesmo assim um dos melhores na defesa contra a corrida.

Corey Linsley: Ok, o rookie não fez nada de extraordinário, mas não comprometeu. Atirado aos lobos, num jogo tremendo e perante um publico adverso, participou activamente em vários bloqueios, tentando ser disruptivo na luta contra a DL. Sem erros assinaláveis, sobreviveu para contar a história.

Negativo

Lesões: É sempre dramático assistir à forma como as lesões interferem nas possibilidades de êxito duma equipa. Os Packers podem estar em sarilhos. Dos grandes. No training camp, Don Barclay, OT, teve um torn ACL. Perdido para a temporada. No embate contra os Seahawks, o right tackle Bryan Bulaga foi atropelado, num lance azarado, pelo próprio colega de equipa, o rookie Richard Rodgers, saindo lesionado e agarrado ao joelho esquerdo (o mesmo que o levou a perder a temporada de 2013). Se a lesão for grave, a profundidade do sector fica comprometida. E ainda estamos apenas na week 1. O substituto de Bulaga, Derek Sherrod, foi infeliz. Exibicionalmente desastrado, comprometeu a coesão da unidade, nunca conseguindo anular as investidas dos pass rushers. É pelo lado dele que Cliff Avril obtém o sack. E é também por ali que Bennett passou como um foguete para um strip sack que valeu um safety e dois pontos no marcador.

Run Defense dos Packers: 207 jardas corridas pelos Seahawks. 110 delas por Marshawn Lynch. É preciso dizer mais? Datone Jones, Mike Daniels, AJ Hawk e Brad Jones foram incapazes de travar o que quer se fosse.

Earl Thomas: É um dos únicos erros que se podem apontar aos Seahawks. Para quê apostar no safety para o papel de retornador? Nunca compreendi na preseason. Muito menos consigo fazê-lo agora. Um dos jogadores mais importantes da equipa exposto no special team à arbitrariedade de uma qualquer pancada? Não faz sentido. E Earl Thomas, que até tinha desempenhado o papel de forma competente nos jogos a “brincar”, foi um não-factor no jogo inaugural da regular season. No primeiro punt return conquistou meras 3 jardas. No segundo fez uma má leitura da situação, preterindo a fair catch e cometendo um fumble, que deu pontos ao adversário.

About The Author

Paulo Pereira

O meu epitáfio, um dia mais tarde, poderá dizer: “aqui jaz Paulo Pereira, junkie em futebol americano”. A realidade é mesmo essa. Sou viciado. Renascido em 2008, quando por mero acaso apanhei o Super Bowl dos Steelers/Cardinals, fiz um reset em [quase] todos os meus dogmas. Aquele desporto estranho, jogado de capacete, entranhou-se no meu ADN, assumindo-se como parte integrante da minha personalidade. Adepto dos Vikings por gostar, simplesmente, de jogadores que desafiam os limites. Brett Favre entra nessa categoria: A de MITO.