E o Melhor QB de Sempre É…

Qualquer resposta a esta pergunta é garantia de acalorada discussão, que aliás, ocorre regularmente entre os amantes do Futebol Americano, sendo que restam sempre dúvidas sobre como é que um determinado QB compara com QBs de outra época. O facto de o QB ser tradicionalmente a “cara” da franchise, é, por si por só, o suficiente para cada um defender a sua posição aguerridamente e até ao limite das forças. Vários tipos de critérios podem ser utilizados para fazer valer o nosso ponto de vista, desde os mais subjectivos – o que tem a tatuagem mais radical, ou o que tem a namorada mais vistosa – passando, por intermédios – como por exemplo o que fez a jogada mais bonita, ou mais emblemática – até aos mais objectivos, quer individuais – QB Rating, %TDs por passe, etc – ou colectivos – Percentagem de jogos ganhos, ou títulos conquistados.

Pessoalmente, prefiro recorrer a critérios mais objectivos, que desde logo permitam, mesmo levando em conta as grandes alterações que se verificaram ao longo destes 94 anos de NFL, tirar algum tipo de conclusões. Bem sei que os números são entidades abstractas, mas quando são utilizados para mensurar e quantificar acontecimentos, tornam-se um poderoso instrumento. E, felizmente, o Futebol Americano tem a vantagem de ser um desporto altamente mensurável e quantificável, sendo que a prova disso mesmo são todas as estatísticas utilizadas nas Fantasy Leagues que nos “roubam” tanto tempo e que geram saudáveis rivalidades, levando a que não raras vezes as pessoas torçam para que um jogador da sua equipa favorita não marque mais pontos, por o mesmo jogar numa equipa Fantasy rival (por falar em Fantasy, já se inscreveram no nosso Fantasy Championship?).

Um dos QBs que actualmente goza de maior popularidade é Tom Brady. Parte dessa popularidade é justificada, tendo em vista as suas realizações nos diferentes estádios onde tem comandado os seus Patriots. Mas também há uma parte que é, quanto a mim, manifestamente exagerada, quer motivada pela sua persona mediática, quer devido às suas conquistas serem relativamente recentes, e ainda devido a uma comparação excessiva e quase exclusiva face a Peyton Manning (feita quase sempre de modo a explorar as “fraquezas” deste ultimo). Posto isto, a questão impõe-se: será Brady o melhor QB de sempre?

Tom Brady

O que eu me proponho é, ao longo de um conjunto de artigos, quantificar e comparar as conquistas individuais e colectivas deste emblemático QB, face a um painel de 15 QBs que, pelo que fizeram e, em alguns casos, continuam a fazer, causavam/causam receio e apreensão a qualquer defesa que tivesse/tenha que os defrontar. Estes 15 QBs representam as últimas 7 décadas da NFL, sendo que 12 estão já no Hall Of Fame; um, apesar de retirado, aguarda o fim do seu período de eligibilidade para ser nomeado; e, os restantes são QBs sobre os quais existe algum consenso que serão First Ballot Hall Of Famers.

A Análise

A minha análise irá incidir em 4 grandes grupos de indicadores, a saber:

• Passing Regular Season
• Rushing Regular Season
• Playoffs
• Títulos e Outras Conquistas

No entanto, antes de começar, é premente tecer algumas notas prévias sobre alterações relevantes ao jogo, pelo impacto que tiveram ao longo do tempo nos números e nas estatísticas dos QBs, a saber:

Filosofia de Jogo

A NFL era na sua génese uma liga que baseava o seu jogo muito na corrida. Nas décadas de 40, 50, 60 e 70, o jogo era essencialmente feito em corrida – a expressão que descrevia bem a mentalidade ofensiva da NFL até meados da década de 70 era “três jardas e uma nuvem de pó”, o que contrastava com a AFL (surgida no início da década de 60 e que viria a juntar-se com a NFL no final da mesma década), cujo jogo era muito mais baseado no passe. Com a fusão, o jogo começou a mudar, passando a depender mais do passe. E, se na década de 90 a situação estabilizou um pouco, a realidade é que com o virar do milénio, a NFL passou a ser uma liga claramente baseada no passe. Como tal, é expectável que os QBs mais antigos tenham números mais baixos que os mais recentes.

Duração das Temporadas/Playoffs

Na década de 50 a regular season da NFL era de apenas 12 jogos. Em 1961 a regular season passou para 14 jogos, e em 1978 para os actuais 16. Obviamente, menos jogos, menos hipóteses de “enchumaçar” as estatísticas, e acumular jarda atrás de jarda, e TD atrás de TD.

Em termos de playoffs, tradicionalmente um único jogo decidia o campeão até ao ano de 1967, onde, com a expansão da NFL para 16 equipas, os playoffs passaram a ser jogados a 2 rondas, com o Superbowl no final. Este figurino manteve-se mesmo após a fusão com a AFL, até 1978, onde passou a vigorar a ronda de Wild Card. Uma vez mais, menos jogos, menos hipóteses de “engordar” as estatísticas.

Alteração das Regras

A mudança de filosofia de jogo atrás referida não é alheia a alterações operadas nas regras, introduzidas de modo a abrir mais o jogo. Três dessas alterações merecem destaque:

• Em 1978 foi introduzida a “Mel Blount Rule” (nomeada em honra do CB dos Steelers) que passava a limitar o contacto entre os defesas e os WRs a uma faixa de 5 jardas da linha de scrimmage, quando anteriormente os defesas podiam iniciar – e oh!, se iniciavam … – contacto com os WRs em todo o campo, antes de o passe ser iniciado. Esta regra, por si só, veio revolucionar por completo o jogo. Ainda para facilitar o passe, nesse mesmo ano de 1978, passou a ser permitido aos OLs bloquear nas jogadas de passe com os braços estendidos e as mãos abertas. O resultado é observável com o aumento das estatísticas de passe, bem como com o aumento da preponderância das jogadas de passe nos planos ofensivos das equipas.
• Em 1993, a NFL alterou a definição de intentional grounding, sendo que deixou de ser falta se um QB fora do pocket atirar a bola para o chão ou para fora, mesmo que nenhum jogador ofensivo elegível tenha que se encontrar próximo da zona onde esta toque no chão ou saia de campo, desde que a bola passe ou toque na linha de scrimmage,. Anteriormente, um passe feito nestas condições, sem um receiver por perto dava imediatamente direito a 10 jardas de penalização e perda de down. Convenhamos que isto veio facilitar a vida dos QBs, porque a simples perda de down – o atirar a bola para fora – é muito menos penalizadora do que um passe incompleto e 10 jardas de penalização, ou alguns cenários catastróficos – um sack, um fumble, ou uma intercepção motivada por um passe efectuado sobre pressão – decorrentes de evitar a penalidade. É certo, que o número de passes incompletos poderá aumentar, mas a contabilidade é fácil de fazer – vantagem, QBs que jogaram maioritariamente depois de 1993.
• Em 2011, a NFL alterou a regra que proíbia o contacto ostensivo com defenseless players. Assim, passou a ser punido com 15 jardas e first down automático qualquer situação em que os defesas utilizem deliberadamente o capacete, facemask, antebraço, ou ombro, para acertar em, ou, se lancem contra, os mesmos defenseless players. Adicionalmente, a definição de defenseless player passou a listar, entre outras, as seguintes definições:
  • Um jogador no acto de fazer um passe, ou imediatamente após a o ter feito
  • Um receiver a tentar receber um passe ou um receiver que não tenha completado a sua recepção e como tal, não tenha tido tempo para se proteger.

Esta regra tem dois impactos substanciais: um QB que esteja sobre pressão, basta-lhe iniciar o movimento de passe para deixar de ter receio sobre o que possa acontecer, sendo que o número de intercepções por o QB ser placado no momento do passe, e na sequência, a bola sofrer uma alteração de trajectória, tenderá a desaparecer.

Por outro lado, permite que jogadores mais franzinos, mas mais rápidos e ágeis possam jogar como receivers, pois não correm o risco de serem “decapitados”, como muitas vezes acontecia no passado.

Nas décadas de 70 e 80 dizia-se que um receiver que recebesse passes entre as hash marks tinha que ser forte não só fisicamente, mas também mentalmente, pois receber um passe nessa zona ia ter consequências, e o receiver tinha que estar mentalmente (e fisicamente) preparado para as pagar.

As vantagens para os QBs são mais que óbvias.

No próximo artigo iremos revelar o painel de QBs e analisar formas de mitigar estas contingências na análise.